Em unidade e luta

Vencer a precariedade<br>e a exploração

Margarida Botelho (Membro da Comissão Política)

«A pre­ca­ri­e­dade dos vín­culos la­bo­rais é es­pe­ci­al­mente grave: gera ins­ta­bi­li­dade no tra­balho e na vida, fo­menta o de­sem­prego, agrava a ex­plo­ração» – foi assim que o XIX Con­gresso do Par­tido abordou as ques­tões da pre­ca­ri­e­dade, as­si­na­lando que, à data, eram mais de um mi­lhão e du­zentos mil os tra­ba­lha­dores, no­me­a­da­mente jo­vens, afec­tados por este ver­da­deiro fla­gelo.

A pre­ca­ri­e­dade não é um de­creto de im­pos­si­bi­li­dade de luta

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A pre­ca­ri­e­dade é con­sequência do de­sen­vol­vi­mento da po­lí­tica de di­reita e é um dos prin­ci­pais ins­tru­mentos do grande ca­pital para au­mentar a ex­plo­ração, roubar di­reitos e tentar di­vidir os tra­ba­lha­dores. Não é um pro­blema «dos jo­vens», até porque tende a ge­ne­ra­lizar-se a todas as idades, a todos os sec­tores, a todas as pro­fis­sões. Afecta pro­fis­sões ope­rá­rias e in­te­lec­tuais, tra­ba­lha­dores sem qua­li­fi­ca­ções es­pe­cí­ficas e qua­dros al­ta­mente es­pe­ci­a­li­zados, jo­vens à pro­cura do pri­meiro em­prego e tra­ba­lha­dores com de­zenas de anos de car­reira. Vê-se à porta de grandes uni­dades in­dus­triais, em au­tên­ticas praças de jorna, em em­presas de tra­balho tem­po­rário, em ex­plo­ra­ções agrí­colas, hos­pi­tais ou es­colas.

Os tra­ba­lha­dores não são pre­cá­rios. Pre­cá­rios são os vín­culos e as suas re­la­ções de tra­balho, fa­ci­li­tados por su­ces­sivas al­te­ra­ções à le­gis­lação la­boral da res­pon­sa­bi­li­dade dos di­versos go­vernos da troika na­ci­onal. Ad­mite-se con­tratos a termo por todos os mo­tivos e mais al­guns: porque o tra­ba­lhador nunca foi efec­tivo, porque está de­sem­pre­gado há mais de um ano, porque há acrés­cimo de ac­ti­vi­dade na em­presa ou porque a en­ti­dade pa­tronal vai criar nova uni­dade de pro­dução. Na ad­mi­nis­tração pú­blica, em que a ex­plo­ração do tra­balho dos de­sem­pre­gados se faz a co­berto dos cha­mados «con­tratos em­prego-in­serção», são mi­lhares os que fazem falta todos os dias nos mais di­versos ser­viços pú­blicos mas que não têm mais do que uma per­ma­nente in­se­gu­rança nas suas vidas.

Tal si­tu­ação criou em muitos tra­ba­lha­dores a con­vicção de que podem estar eter­na­mente a con­trato a termo ou tem­po­rário, re­pe­tindo com fa­ta­lismo o ha­bi­tual es­tri­bilho da ide­o­logia das ine­vi­ta­bi­li­dades: antes mal que pior...

Lutar e vencer

«A luta contra a pre­ca­ri­e­dade ex­pressa-se por ob­jec­tivos rei­vin­di­ca­tivos con­cretos nos lo­cais de tra­balho que pro­movam a trans­for­mação dos vín­culos la­bo­rais pre­cá­rios em vín­culos efec­tivos, apoi­ados por ac­ções mais ge­rais de de­núncia e sen­si­bi­li­zação pú­blica. A sin­di­ca­li­zação e or­ga­ni­zação dos tra­ba­lha­dores em si­tu­ação de vín­culo pre­cário é vital para a sua in­serção na luta e para fa­vo­recer a uni­dade de classe entre os tra­ba­lha­dores», con­tinua a re­so­lução po­lí­tica do nosso Con­gresso.

A se­pa­ração entre tra­ba­lha­dores com de­ter­mi­nado tipo de di­reitos e ou­tros quase sem di­reitos ne­nhuns é um de­sastre para a or­ga­ni­zação e para a luta rei­vin­di­ca­tiva de todos. A pre­ca­ri­e­dade não é um de­creto de im­pos­si­bi­li­dade de or­ga­ni­zação e luta. É um dado da re­a­li­dade com que li­damos di­a­ri­a­mente. Nal­gumas em­presas, nal­guns sec­tores, é regra ab­so­luta.

A luta dos tra­ba­lha­dores com vín­culos pre­cá­rios tem cres­cido nos úl­timos anos, bem como a so­li­da­ri­e­dade para com eles ex­pressa por tra­ba­lha­dores com vín­culos mais es­tá­veis. Par­ti­ci­param em greves, ge­rais e sec­to­riais, em ma­ni­fes­ta­ções e ac­ções de pro­testo. Sin­di­ca­li­zaram-se – só em 2014, foram mais de quatro mil os jo­vens que deram esse passo – e re­for­çaram com a sua energia, ex­pe­ri­ência e con­vicção o mo­vi­mento sin­dical uni­tário. Muitos re­sis­tiram, lu­taram, ven­ceram.

Foram muitos, por todo o País, os tra­ba­lha­dores com vín­culo pre­cário, ou des­pe­didos ile­gal­mente, que con­se­guiram ga­rantir o seu posto de tra­balho, através da acção dos seus re­pre­sen­tantes, in­clu­si­va­mente em ac­ções ju­di­ciais in­ter­postas pelos sin­di­catos ga­nhas em tri­bunal. Tra­ba­lha­dores com meses – e em al­guns casos com anos – de con­tratos tem­po­rá­rios, ou a re­cibos verdes, foram re­ad­mi­tidos em em­presas in­dus­triais, mas também em IPSS, em­presas do co­mércio ou dos ser­viços, em ins­ti­tui­ções do Es­tado. Em quase todos, con­se­guiu-se provar que os tra­ba­lha­dores eram efec­tivos porque os con­tratos es­tavam mal fun­da­men­tados na ex­cepção que ti­nham de es­ta­be­lecer à regra que ainda está na lei: a um posto de tra­balho efec­tivo tem de cor­res­ponder um vín­culo de tra­balho efec­tivo.

Ontem, foi dis­cu­tido na As­sem­bleia da Re­pú­blica o Pro­grama Na­ci­onal de Com­bate à Pre­ca­ri­e­dade La­boral e à Con­tra­tação Ilegal, pro­posto pelo PCP, que prevê a pro­moção de vín­culos con­tra­tuais es­tá­veis e du­ra­douros, o com­bate às formas de tra­balho não de­cla­rado e de con­tra­tação ilegal e às vá­rias formas de trá­fico de mão-de-obra, pro­mo­vendo a ine­xis­tência de in­ter­me­di­ação na re­lação la­boral, a pro­moção do exer­cício de di­reitos in­di­vi­duais e co­lec­tivos dos tra­ba­lha­dores.

Para com­bater e vencer a pre­ca­ri­e­dade e a ex­plo­ração, é in­dis­pen­sável dar aos tra­ba­lha­dores a con­fi­ança de que pre­cisam para re­clamar que a cada posto de tra­balho efec­tivo tem de cor­res­ponder um vín­culo efec­tivo. Con­fi­ança que só o Par­tido, o mo­vi­mento sin­dical e a uni­dade de classe podem dar.

 



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